No a la Guerra, de Vera Chaves Barcellos, 2003/2007, vídeo
O Museu de Arte do Rio iniciou um programa chamado Mulheres na Coleção MAR, cujo objetivo é expandir o número de artistas mulheres no acervo do museu e fomentar iniciativas que priorizem o protagonismo da mulher, como artista e/ou integrante do processo conceitual e curatorial. A exposição – de mesmo nome – inaugurou esse novo programa do MAR e mostra a presença feminina nas artes visuais em cinco estruturas: Retrato e Representação; Corpo Político; Cidade e Paisagem, Abstrações e Poéticas.[1] Segundo as “mulheres do MAR”, o programa pretende também desestabilizar o tradicional modelo curatorial presente nas instituições – não somente na questão de gênero – pois aposta em um processo colaborativo formado por mulheres de diferentes áreas de atuação da própria Instituição. Seguranças, recepcionistas, produtoras, auxiliares de serviços gerais, jornalistas, designers, museólogas, gestoras, todas em encontros de debates para se pensar o feminino com base em suas experiências particulares.
A anterior Secretária Municipal de Cultura do Rio de Janeiro, Nilcemar Nogueira, defendeu esse novo modelo experimentado no Museu de Arte do Rio, complementando que “essa forma de inclusão ampla e de oportunidade de participação, de voz e de decisão compartilhada dialoga com as prioridades da atual gestão da Secretaria Municipal de Cultura [...]”.[2] Posicionamento primordial para uma Instituição que mantém parceria com órgãos públicos, e que dialoga com a definição de Martin Grossmann sobre museu de arte hoje, “[...] uma tradição, um espetáculo, um lugar político, uma promoção social, uma arena para processos de ação socio-cultural, uma especulação, uma coorporação, uma experiência, bem como alegoria ou metáfora para a explanação, criação e manutenção de outras dimensões de conhecimento.”[3]
Ao contextualizar essa iniciativa com o conceito de Etnocentrismo – onde existe o “[...] pressuposto de que o ‘outro’ deva ser alguma coisa que não desfrute da palavra para dizer algo de si mesmo”[4] – é possível concluir a importância da escolha em dar o “lugar de fala” à mulher, e de assim criar a sua própria narrativa e leitura sobre a sua identidade. É exatamente a atitude que caminha em direção oposta a ideias etnocêntricas perpetuadas ao “grupo mulheres”. Como escreveu Everardo Rocha: “No universo da indústria cultural é criado sistematicamente um enorme conjunto de ‘outros’ que servem para reafirmar [...] uma série de valores de um grupo dominante que se auto-promove a modelo de humanidade”[5]
E falar de protagonismo feminismo é lembrar da escritora e psicanalista Clarissa Pinkola Estés, autora de Mulheres que correm com os lobos (1994). Para Estés, é inevitável a necessidade de se libertar. De encontrar “a sua loba”. Em sua obra, as mulheres são comparadas a lobos, onde a ambos foram atribuídas famas injustas, e perseguições. Ao abordar as rupturas e padrões impostos à mulher, ela acrescenta questões relacionadas à alma feminina, defendendo que “[...]não podem ser tratadas tentando-se esculpi-la de uma forma mais adequada a uma cultura inconsciente, nem é possível dobrá-la até que tenha um formato intelectual mais aceitável para aqueles que alegam ser os detentores do consciente.”[6] Em tom confessional, diz: “por isso, igual a muitas mulheres antes e depois de mim, passei minha vida como uma criatura disfarçada.”[7]
De vez em quando, é possível encontrar reflexões filosóficas nas mais diversas situações cotidianas. O que me lembra uma experiência pessoal. Apresentação de experimentos com papel. Água. Nanquim. Professora Cristina Salgado. Ela olhou. Observou. Falou algumas coisas. Por hábito, guardo as críticas. Ela falou que eu poderia ter ousado mais, ido mais além.
Até que me olhou fixamente e disse: O que te prende?
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Catálogo Exposição “Mulheres na Coleção MAR”.
ESTES, Clarissa Pinkola. Mulheres que correm com os lobos. Rio de Janeiro: Rocco, 1994.
GROISMAN, Martin. O museu de arte hoje. Disponível em:
http://www.forumpermanente.org/revista/edicao-0/textos/o-museu-de-arte-hoje Último acesso
em: 23 Abril 2019.
ROCHA, Everardo. O que é Etnocentrismo. São Paulo: Editora Braziliense, 1988.
[1] Catálogo Exposição “Mulheres na Coleção MAR”. Museu de Arte do Rio, 2019.
[2] Catálogo Exposição “Mulheres na Coleção MAR”. Museu de Arte do Rio, 2019.
[3] GROISMAN, Martin. O museu de arte hoje. Disponível em:
http://www.forumpermanente.org/revista/edicao-0/textos/o-museu-de-arte-hoje Último acesso
em: 23 Abril 2019.
[4] ROCHA, Everardo. O que é Etnocentrismo. São Paulo: Editora Braziliense, 1988. p.6.
[5] ROCHA, Op. Cit. p.9.
[6] ESTES, Clarissa Pinkola. Mulheres que correm com os lobos. Rio de Janeiro: Rocco, 1994. p.9.
[7] ESTES, Loc. Cit.